27 de fev. de 2016

Sobre a experiência de leitura

Autoria: Carlos Andrei Siquara.
Fonte: O Tempo. Data: 23/02/2016.
URL: www.otempo.com.br/divers%C3%A3o/magazine/sobre-experi%C3%AAncias-de-leitura-1.1240852
A pedagoga Daniela Figueiredo discute a formação de jovens leitores e o papel das bibliotecas públicas hoje em BH
Há três anos, a pedagoga Daniela Figueiredo resolveu investigar os hábitos de leitura de jovens, o que a levou a uma pesquisa de mestrado centrada no papel das bibliotecas públicas na formação desses leitores. Após defender o trabalho no ano passado, ela realiza hoje um encontro na Biblioteca Pública Infantil e Juvenil de Belo Horizonte, onde vai comentar com o público as principais ideias e percepções resultantes desse processo.
Um ponto ressaltado por ela é a desmitificação do desinteresse desse público por esses espaços. “Ao contrário do discurso que insiste no fato de que os jovens não leem nada, quando eu fui a algumas bibliotecas, eu notei que muitos deles participavam de atividades de leitura e pegavam livros emprestados. Isso me inquietou e me levou a conhecer melhor esses ambientes que recebem esses leitores e promovem ações voltadas, principalmente, ao incentivo do contato com obras literárias”, afirma Figueiredo.
Outro aspecto que chamou a sua atenção foi a maneira como os frequentadores criavam uma relação com os bibliotecários, o que ao seu ver refletia não só a constante presença deles, mas uma ligação baseada no diálogo. “Eu notei que o envolvimento que eles tinham com os bibliotecários era importante para eles estarem ali. O funcionário saber quem é o jovem, chamá-lo pelo nome, ter uma noção do que ele gosta de ler se revelavam algo essencial, inclusive para a introdução de novas leituras”, diz.
Em 2014, a pesquisadora conta que visitou quatro bibliotecas municipais e também realizou entrevistas com os leitores. Nesta segunda etapa, ela os visitou em casa, o que também foi relevante para compreender a importância do meio familiar para estimular a fruição dos livros.
“Essa ida às casas dos jovens deixou claro que quem costumava frequentar a biblioteca geralmente vinha de uma família que valorizava a leitura. Boa parte dos meninos que eram levados quando crianças continuava participando das ações à medida que crescia. Eles também apontavam, na casa deles, às vezes, um lugar onde guardavam suas leituras, e isso indicavam a maneira como o hábito era cultivado”, completa.
Figueiredo observa que é muito comum os jovens se guiarem a partir dos gostos dos colegas quando o assunto é um livro a ser lido. Portanto, é comum a reprodução nas bibliotecas do foco nos best-sellers do momento, enquanto também há o perfil de outros que buscam alternativas a esse padrão.
“Há uma relação de rede. Eles leem o que todo mundo está lendo, pois esse é um fator que traz pertencimento a um grupo. Porém, ao mesmo tempo, nós vemos que alguns querem fugir desse modelo do best-seller, especialmente quando percebem que há uma espécie de enredo que se repete nessas narrativas”, relata.
Em razão disso, ela comenta ser fundamental a atuação dos bibliotecários, que podem sugerir obras a partir dessas demandas. “Numa das bibliotecas que visitei, por exemplo, eu percebi que os jovens liam muitos títulos com temas de terror, como aqueles sobre vampiros. O bibliotecário, tendo em vista esse interesse, mostrou a alguns deles as obras de Edgar Allan Poe e, assim, aos poucos, eles foram se familiarizando e se apropriando desse autor e de outros que não estão nas listas dos mais vendidos”, afirma.

Figueiredo também questiona a ideia de a leitura de uma obra popular poder levar o jovem a se interessar por outras do repertório clássico. Contudo, ela frisa a necessidade de a biblioteca acolher e permitir o acesso a uma diversidade de conteúdo. “Não acho que exista essa passagem, quase como se fosse uma ascensão do best-seller para o clássico. O que eu entendo é que a biblioteca deve possuir uma variedade de acervo capaz de mostrar ao jovem as várias possibilidades de leitura. O diálogo também é fundamental para que eles construam o entendimento e o significado em torno dos diversos livros”, conclui.

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